David Freire
Subeditor do portal Tribuna do Norte
C arlos Ferreirinha, considerado um dos principais especialistas no mercado de luxo do Brasil, afirma que o turismo de forma geral e o turismo de luxo em particular, podem ser forças importantes de posicionamento diferenciado para o Rio Grande do Norte, como destino. “O turismo de luxo eleva a qualificação do destino com produtos de hospitalidade e serviços excepcionais. Ferreirinha é pioneiro e referência na tradução da inteligência da gestão do luxo na América Latina. Prova disso, é que em seu livro “O paladar não retrocede” apresenta aplicação prática da excelência do luxo no dia a dia das organizações. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, Ferreirinha falou um pouco do atual momento do mercado, de como o Rio Grande do Norte pode se inserir nele e as perspectivas do que está por vir. Confira!
Como você define “luxo” no contexto atual do mercado?
Na verdade, eu entendo o luxo como negócios. E, como tal, a definição que uso e acredito segue sendo a mesma igual ao estado da arte da excelência. O patamar máximo do extraordinário. Produtos e serviços que alcançam o nível máximo de excelência. A movimentação dos conceitos se dá principalmente no comportamento do consumo.
Quanto o mercado de luxo movimentou no brasil ano passado?
A atividade do luxo alcançou em 2023 o valor de 1,5 trilhões de dólares em faturamento. O Brasil, geralmente, representa entre 1% e 2% do resultado global. Estima-se que devemos alcançar 135 bilhões de reais em 2023.
E a estimativa para este ano?
Média de crescimento esperada entre 15% e 23%. Ritmo segue forte e expressivo. História. Joias e arte muito forte. Gastronomia e entretenimento em forte expansão. Carros em ritmo vigoroso. Algumas marcas de moda e acessórios mantendo crescimento vigoroso. Ou seja, de forma geral, a atividade do luxo está em um momento especial.
Como as marcas de luxo podem se adaptar às mudanças no comportamento do consumidor, especialmente em tempos de crise econômica?
Aqui é importante considerar que são muitas as marcas de luxo que já ultrapassaram séculos. Baccarat é uma marca de 259 anos. Hermês é uma marca de 189 anos. Louis Vuitton, 169 anos. Mercedes, 157 anos. Assim, faz-se necessário compreender que essas marcas sabem se adaptar. Esse é um dos motivos que uso há 23 anos na MCF [empresa da qual é presidente], o luxo como inteligência de gestão. Nem todas as marcas precisam, poderiam, deveriam ser luxo, mas todos os produtos, serviços, marcas, operações podem aprender, se inspirar com a inteligência desse modelo de negócios. As marcas de luxo, quase que sempre, são capazes de ler o momento contemporâneo, entender os movimentos atuais, decifrar os códigos. Essa é uma das razões que tornam elas longevas. Se mantém inquietas, se provocam. São de nicho e por isso, se movimentam rapidamente.
Qual é a importância do turismo de luxo para o desenvolvimento do setor do turismo no Rio Grande do Norte?
Na verdade, o turismo é um impulsionador de negócios em qualquer segmento, atividade, em qualquer destino. Felizes dos países que entendem, investem e tornam o turismo uma força de transformação. Vide caso da África do Sul, de Portugal, da Tailândia. Alguns excepcionais exercícios desses destinos como turismo em geral, em particular, do turismo de luxo. Sendo assim, o turismo de forma geral e o turismo de luxo em particular, podem ser forças importantes de posicionamento diferenciado para o Rio Grande do Norte, como destino. O turismo de luxo eleva a qualificação do destino com produtos de hospitalidade e serviços excepcionais.
De que maneira as belezas naturais e culturais do RN podem ser exploradas pelas marcas de moda e luxo?
São muitas as oportunidades que podem ser desde o destino para reconhecimento de clientes especiais, com viagens de experiências, celebração de momentos com colaboradores, editoriais de moda e life style, eventos de lançamentos de produtos, eventos internacionais.
Qual o papel da sustentabilidade na gestão de marcas de luxo atualmente?
Não diferente de qualquer importância e relevância em qualquer outro segmento da economia real. Sustentabilidade e todos os conceitos ESG não são demandas ou prioridades na atividade do luxo e sim, em todas as atividades econômicas. Assim, não há como manter competitividade sem que os temas ESG estejam sendo devidamente gerenciados. Importante, porém, entender que o tema sustentabilidade – ESG são amplos, diversos e extensos. São muitas as ações e iniciativas que vêm sendo feitas pelas marcas de luxo.
Como a tecnologia está transformando o setor de luxo?
Tecnologia está em tudo, absolutamente tudo. Não há como se manter nos tempos atuais, sem que a tecnologia ocupe espaço significativo na diferenciação competitiva. Na atividade do luxo, a tecnologia vem apresentando importantes possibilidades em diversas frentes como inteligência de dados, entendimento de movimentos de mercado, design de produtos, personalização de serviços, clienteling, experiências sem fricção e complexidades em lojas tradicionais, antecipação de informações na hospitalidade trazendo customização. Não é mais forte ou mais significativo na atividade do luxo e sim, em todas as atividades.
De que maneira as marcas de luxo estão utilizando inteligência artificial e big data para melhorar suas operações e estratégias de marketing?
A força da transformação digital nos últimos 20 anos, somado ao intenso avanço da inteligência artificial, será tão mais significativa no mercado do que foi a revolução industrial. Inteligência artificial e big data são pré-requisitos competitivos no mercado como um todo e não apenas da atividade do luxo. A utilização dessas ferramentas e desses avanços serão transformadores, necessários e essenciais.
Que conselhos você daria para novos empreendedores que desejam entrar no mercado de moda e luxo?
Luxo tem a ver com excepcionalidade. Trabalhar no posicionamento do luxo demanda persistência, insistência, resistência. Demanda tempo. Demanda obsessão por detalhes, comprometimento imperativo com a excelência, não concessões ao excelente. Tem a ver com alma, sonho, paixão, emoção. É uma aventura mais do que tudo emocional.
De que forma as empresas locais podem utilizar o e-commerce para expandir suas operações nesse novo mercado?
Então, aqui novamente, muito alinhado a tudo do mercado. Não há mais espaço para perguntas ou questionamento se há ou não espaço para o digital onde o e-commerce faz parte. Isso é uma realidade há mais de 20 anos, com intensidade nos últimos 16 anos. E-commerce é tão importante quanto qualquer outra atividade que impulsiona a geração de negócios. Todos deveriam ter? Não necessariamente. Todos deveriam considerar? Sim. Entretanto, mais do que ter e-commerce, as marcas precisam existir no digital. Chanel não vende moda e acessórios no e-commerce, mas tem um dos melhores conteúdos no online.
Como você vê o futuro do setor de moda e luxo nos próximos anos?
Crescimento. Expansão. Fluido. Rápido. O mundo possui 8 bilhões de pessoas e chegará à 8,8 bilhões de pessoas em 2035. Assim, mais pessoas. É também o momento das cidades não protagonistas, garantindo expansão.
Quem
Fundador da MCF Consultoria & Conhecimento, em 2001, e da Bento Store, premiada entre as mais inovadoras operações de varejo e criador da ABRAEL (Associação das Marcas e Empresas de Luxo). Teve passagens pela Louis Vuitton (presidente da Louis Vuitton Brasil, diretor da divisão Moda do grupo LVMH América Latina, diretor Marketing, Comunicação & Novos Negócios América do Sul e América Latina) na EDS – Electronic Data System (executivo de Vendas, embaixador internacional de Marketing – EUA, diretor de Marketing & Comunicação – Brasil). Responsável pela criação do curso “O Negócio do Luxo” e autor do livro “O paladar não retrocede”.