Mesmo com a popularidade de Lula mais alta no Nordeste do que no resto do país, o PT vem encontrando dificuldades para emplacar candidaturas a prefeito de afilhados políticos do presidente em capitais da região. A situação preocupa o partido, que não governa nenhuma capital e tem o chefe do Executivo como principal cabo eleitoral na tentativa de reverter a situação.
Em cinco das nove capitais nordestinas, o PT nunca elegeu um prefeito desde a redemocratização. Desde o começo do ano, Lula visitou 14 cidades da região, com destaque para três idas ao Recife, além de duas a Salvador e a Fortaleza. O presidente já afirmou que terá cautela para não entrar em campanhas que oponham nomes de sua base, mas que vai se dedicar a palanques contra a “extrema-direita”. Pesquisa Ipec divulgada neste mês mostra que os eleitores do Nordeste que avaliam o governo Lula como ótimo ou bom subiu de 43% para 53% — índice que não ultrapassa a barreira dos 37% em outras regiões do país.
A capital baiana é considerada pelo PT o cenário mais adverso no Nordeste. O partido apoia o pré-candidato do MDB, Geraldo Júnior, que disputa contra o prefeito Bruno Reis (União Brasil), que vai concorrer à reeleição. O partido de Lula nunca esteve à frente da administração em Salvador, apesar de governar o estado ininterruptamente desde 2007 — a legenda tem o receio de um revés em primeiro turno agora. Reis está bem avaliado e tem aparecido nas pesquisas com chances de vencer sem necessidade de segundo turno.
O emedebista espera ter presença mais contundente do ministro Rui Costa (Casa Civil), que governou o estado por oito anos, mas o entorno do ministro avalia os passos com cautela e já disse que não conseguirá se engajar com força na campanha.
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No caso do Recife, o PT abriu mão de duelar com o PSB após uma disputa tensa com a legenda em 2020, com troca de ofensas entre o atual prefeito João Campos (PSB) e a então candidata petista, Marília Arraes. Também pesa a vantagem de Campos para reeleição, com chances de vitória já no primeiro turno — pesquisa Datafolha apontou o prefeito com 75% das intenções de voto.
— Não queremos provocar nova divisão nem com isso fortalecer a oposição e a direita — afirma o presidente do PT em Pernambuco, Doriel Barros.
Coordenador do grupo do PT dedicado às eleições, o senador Humberto Costa (PE) reconhece que há dificuldades em capitais da região:
— O fenômeno da extrema direita é muito forte nas regiões urbanas (do Nordeste) e onde tem mais peso o pentecostalismo. Já no Sul, é o inverso (com apelo dessas forças no interior).
A cientista política Luciana Santana, professora da Universidade Federal de Alagoas, acrescenta que o eleitorado petista está mais concentrado no interior desses estados do que nas regiões metropolitanas:
— As capitais do Nordeste são mais aderentes ao cenário nacional e absorvem mais o conservadorismo do que o interior dos estados.
Em São Luís, assim como no Recife, o PT decidiu apoiar o nome do PSB e estará na aliança do deputado federal Duarte Jr. Lideranças petistas afirmam que o partido está em processo de amadurecimento na cidade e que o melhor é dar força a aliados de esquerda neste momento. Já em Fortaleza, o PT vai enfrentar o PDT, aliado no plano nacional. A pré-candidatura do petista Evandro Leitão, em oposição ao prefeito José Sarto (PDT), já vem gerando rusgas.
— Se Lula comparecer ao palanque de Evandro, será uma afronta — disse o deputado federal André Figueiredo, presidente do PDT.
Como mostrou O GLOBO na segunda-feira, Lula planeja participar da convenção que vai homologar a candidatura do petista. O presidente, que no fim de semana esteve no evento que alçou o nome de Guilherme Boulos (PSOL) em São Paulo, vê a capital cearense como uma das cidades prioritárias para deixar para trás a marca de não governar capitais, retrato que saiu das urnas em 2020 e até então era inédito para o partido.
Em Maceió, embora o PT ainda mantenha a pré-candidatura de Ricardo Barbosa, há chance de entendimento com o MDB, que vai lançar o deputado Rafael Brito,para enfrentar a tentativa de reeleição de João Henrique Caldas (JHC), do PL. A cidade foi a única capital nordestina em que Lula perdeu para Jair Bolsonaro nas eleições de 2022.
Em Natal, a deputada federal Natália Bonavides (PT-RN) aparece em pesquisas internas com chances de ir ao segundo turno, situação semelhante à do ex-prefeito Luciano Cartaxo (PT) em João Pessoa. Já em Aracaju, a pré-candidata do partido é Candisse Carvalho, ainda desconhecida da população. Ela enfrentará a candidata do PL, Emília Corrêa, até agora mais bem posicionada na disputa.
Internamente, a maior aposta está em Teresina, com o deputado estadual Fábio Novo — Lula já disse que participará ativamente da campanha do aliado. A cidade, atualmente comandada por Dr. Pessoa (PRD), que vai tentar a reeleição, tem um histórico de prefeitos tucanos e nunca teve um gestor de esquerda.
O próprio Fábio Novo foi filiado ao PSDB antes de migrar para o PT. O candidato à prefeitura de Teresina conseguiu atrair 12 partidos para sua base eleitoral, entre eles, PSDB, Cidadania, MDB, e parte do PP.
O partido de Ciro Nogueira rachou depois que Bárbara Firmino (PP-PI), herdeira política do pai Firmino Filho, escolheu apoiar Fábio Novo. De acordo com aliados, o movimento ocorreu por causa de um desentendimento com o ex-ministro de Bolsonaro.
— Temos afinidades com o PSDB. Eu tenho um perfil de diálogo, todo diálogo sai dos extremos, formamos uma frente ampla. Você pode ter um perfil político, mas com um histórico técnico — disse Fábio Novo.
Dos 11 mandatos de prefeitos em Teresina desde a redemocratização, 8 foram do PSDB, 3 do MDB e 1 do PTB, um cenário desfavorável em um estado lulista em pleitos nacionais.
Para a cientista política Juliana Fratini, mudanças propostas pelo PT ainda encontram pouca aderência em grandes centros urbanos da região:
— Do ponto de vista do eleitorado das capitais nordestinas, a tradição do voto em clãs e a novidade conservadora ainda parecem mais atrativas do que a proposta de uma guinada que o PT propõe enquanto política pública.
Já o cientista político Cláudio Couto acrescenta outro elemento: a influência menor dos governadores nas eleições das capitais. O PT está à frente de quatro estados, todos na região: Bahia, Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte.
— A popularidade do PT no Nordeste decorre da forma com que o PT se coloca na disputa nacional e nas estaduais, e os governadores costumam ter um peso maior nas cidades do interior do estado. Nas cidades maiores, as sociedades civis são mais organizadas e você tem uma dinâmica do jogo político mais autônomo.