Pela primeira vez, o Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Rio Grande do Norte (SHRBS-RN) elegeu uma mulher para assumir a presidência da entidade. Grace Gosson acumula uma experiência de cerca de 30 anos no ramo hoteleiro e vai gerir o SHRBS-RN para o quadriênio de 2024-2029. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, a diretora jurídica do Hotel Praiamar avalia os impactos gerados pela pandemia e recuperação do setor, esclarece a proposta do turismo para a Reforma Tributária e afirma ver a nova recomendação do Ministério Público do Rio Grande do Norte que proíbe novas construções na Via Costeira com “muita preocupação”. Confira.
Como o setor de hotéis, bares e restaurantes está se recuperando após o período de pandemia?
A pandemia nos mostrou que certos eventos mundiais podem ter um impacto local forte, gerando incerteza e insegurança quanto ao futuro. Foi, de fato, impactante, ver, de uma hora para a outra, muitas empresas fecharam, terem que se reinventar para sobreviver. Assim, de lá para cá, o setor vem recuperando o fôlego e recompondo as perdas, mas ainda existem as dívidas contraídas, todos os prejuízos econômicos que se somaram ao longo desses últimos anos e que estão sendo honrados somente do ano passado para cá.
Em relação ao aumento do fluxo de turistas, houve um aumento, embora o Rio Grande do Norte tenha perdido muito espaço para destinos nacionais como João Pessoa, Maceió e até Recife, por conta da atualização de sua infraestrutura.
Como as tecnologias e inovações implementadas durante a pandemia continuam impactando o setor?
Com a pandemia, o setor teve que implementar inovações, a exemplo, dos serviços de delivery nos restaurantes e bares. Agora, já estamos entrando em outra fase, a de um maior uso da inteligência artificial na operação dos estabelecimentos. Vários aspectos do dia a dia da execução de atividades estão sendo melhoradas, como o check-in online, os motores de reservas, entre outros. Antes o hóspede demorava mais tempo na recepção e agora isso vai facilitar e diminuir essa espera até chegar ao apartamento.
Uma pesquisa recente da Abrasel mostra que 40% dos restaurantes não conseguem reajustar os preços acompanhando a inflação. Como você vê soluções para isso?
Uma forma de melhorar a receita de qualquer estabelecimento é, de fato, aumentar o seu movimento, seja através da vinda de mais turistas, ou mesmo do estímulo de maior consumo pelos moradores locais. Destinos como Pipa e São Miguel do Gostoso são conhecidos por terem uma sazonalidade maior, e aumentar o fluxo de visitantes, inclusive com a realização de eventos específicos, que estimulem a ida a esses locais, é uma boa alternativa. Ademais, o maior fluxo de visitante acaba alcançando toda a cadeia econômica, desde hotéis, restaurantes, bares e serviços turísticos.
Com a alta estação chegando, quais são as perspectivas do setor?
Nós estamos otimistas para superar os números do verão de 2024. Todo setor está se preparando para isso.
Como o setor de turismo vem contribuindo para a geração de empregos no Rio Grande do Norte?
A cadeia turística movimenta 52 setores da economia, e emprega uma quantidade grande de mão de obra de nível básico. São camareiras, cozinheiros, garçons, lavadeiras, então acabamos alcançando uma quantidade expressiva da população, envolvendo grande parte da comunidade local. Nesse aspecto, somos o setor econômico que mais produz recursos para o Estado do Rio Grande do Norte. Assim, à medida que a cadeia turística cresce, por consequência, se gera mais empregos em nosso Estado.
Você avalia que a engorda de Ponta Negra pode impactar positivamente o setor de turismo e de lazer?
A engorda veio para trazer benefícios para o turismo e também para o morador da Cidade de Natal. Com o avanço do mar, a população local e o turista ficam privados de utilizar a faixa de areia da praia. E o avanço da erosão coloca em risco o maior cartão postal de nossa Cidade, que é o Morro do Careca. Lembramos que a engorda é uma obra que vem sendo pleiteada desde 2012 e já foi objeto de muitos estudos demonstrando os impactos positivos.
Sobre a recomendação do Ministério Público que pretende proibir novas construções na Via Costeira, como você considera o impacto para o turismo?
Essa recomendação do MP traz muita preocupação para o setor turístico, especialmente por gerar ainda mais insegurança jurídica em um local muito hostil à implantação de novos investimentos. Lembro que todo o processo de votação e aprovação do novo Plano Diretor, desde as discussões, as audiências Públicas, votações, foi acompanhando pelos Promotores de Justiça do Meio Ambiente. Então, não tem cabimento voltar a essa discussão. Isso faz com que eventuais empreendedores fiquem na incerteza se poderão ou não dar continuidade nos seus investimentos em Natal. É preciso que se tenha segurança jurídica no início, meio e fim da operação.
Quais medidas você acredita que são essenciais para fortalecer o setor de hóteis, bares e restaurantes no Rio Grande do Norte?
São necessários investimentos públicos em nossa infraestrutura e segurança para que o turista se sinta bem, além da divulgação do destino através de várias ações que já são feitas.
Na proposta da Reforma Tributária para o turismo, como os hotéis poderão ser impactados?
A Reforma Tributária propõe a unificação dos tributos sobre o consumo, como o ICMS, ISS, IPI, PIS e COFINS e se torne o IBS, no âmbito municipal/estadual, e CBS, no âmbito federal. Hoje, somando o ISS, PIS e COFINS, os hotéis pagam em torno de 8,25%. Com a proposta de regulamentação que se encontra em discussão no Senado, estima-se que essa alíquota chegue a 28%. É um aumento muito considerável. O que o setor pretende é que esse número fique em torno de 11%, que é uma alíquota possível de gerar competitividade com os Países integrantes da OCDE, cuja tributação média é de 11,5%. Se o Legislativo não atender a esse pleito, perderemos competividade com Países como Argentina, Chile, Uruguai e Portugal, cuja média da tributação sobre o consumo está em 11,5%. Se você tem uma tributação mais alta, os pacotes turísticos ficam mais caros. Nosso objetivo é reter os turistas no Brasil. Essa é uma discussão que vem sendo travada diariamente, tanto pela Associação Brasileira de Hotéis no âmbito nacional, quanto pela regional. Estivemos com nossos três senadores, Zenaide, Styvenson e Flávio Azevedo em Brasília, e todos os três se comprometeram em apoiar esse regime diferenciado, de modo que o setor hoteleiro mantenha uma alíquota competitiva, e consiga manter e gerar mais empregos.
Com a Lei Geral do Turismo, sancionada na última quinta-feira, quais são as novas mudanças para o setor?
Um dos pontos importantes foi a criação de uma Mapa Brasileiro do Turismo, de forma a identificar regiões e municípios que têm a maior vinda de turistas e, consequentemente, destinarem recursos de maneira estratégica, permitindo um melhor investimento público. É a partir daí que você percebe a importância do Rio Grande do Norte se manter sempre como um destino bem procurado e fortalecer essa divulgação, porque uma coisa leva a outra: se você traz o turista, você acaba sendo indicado para o Mapa. Outro aspecto relevante foi incluir na diária o tempo necessário para que se proceda com a higienização e arrumação dos quartos. Esse era um tema que sempre trazia dúvidas, se a diária teria que somar as 24 horas disponíveis para o hóspede ou se poderia ser menor. A Lei Geral do Turismo entendeu que é possível inserir um tempo para higienização, arrumação e manutenção dos quartos. Importante, ainda, lembrar, que essa lei previu o enfrentamento à exploração sexual de crianças e adolescentes no setor, incluindo tal preocupação na Política Nacional de Turismo.
Quem
Grace Gosson tem 47 anos, é casada e mãe de três filhos. Advogada, mestre em Direito Público pela PUC/SP, e hoteleira em Natal há cerca de 30 anos, ela é a primeira mulher a assumir a presidência do Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Rio Grande do Norte (SHRBS-RN). Ao mesmo tempo, Grace ocupa a cadeira de Diretora Jurídica do Hotel Praiamar e tem atuado em negociações coletivas sindicais há pelo menos cinco anos.