Com histórico político mais alinhado ao campo progressista na última década, o Nordeste é a principal aposta do PT para ampliar seu número de prefeitos. O partido do presidente Lula está lançando candidatos em cinco das nove capitais da região, quatro deles com chances reais de chegar ao segundo turno. Teresina, Fortaleza, Natal e João Pessoa vão receber atenção especial da legenda, cidades onde os petistas aparecem bem colocados nas pesquisas e tendem a crescer no decorrer da campanha, que só começa oficialmente em 15 de agosto.
Em Teresina, o deputado estadual Fábio Novo é o candidato mais bem posicionado nas pesquisas, em algumas delas chega a ter mais de 50% dos votos válidos, e pode liquidar a fatura ainda no primeiro turno. Se a projeção for confirmada, vai quebrar uma hegemonia da direita de várias décadas e ser o primeiro prefeito do PT a governar a capital piauiense. O principal adversário de Novo é o ex-prefeito Sílvio Mendes, do União Brasil, apoiado pelo bolsonarismo e pelo ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, Ciro Nogueira (PP), com 43% dos votos válidos, segundo o Instituto Consulte.
Novo conseguiu formar uma ampla aliança em torno do seu nome, com 13 partidos, inclusive com o histórico adversário PSDB, e cedeu o posto de vice ao MDB, que indicou o médico Paulo Márcio. “Em 2020, a gente não conseguiu unificar a base do governo, que se dividiu em quatro candidaturas, nem mesmo unir o PT, que chegou a ter quatro nomes. Desta vez, primeiro unimos o partido, depois a base do governo, e ainda conseguimos atrair algumas forças que historicamente eram contrárias a nós, como o PSDB, que governou a cidade quatro vezes”, explica o piauiense. “O PT sempre teve muita dificuldade de lançar candidaturas competitivas em Teresina e agora apostou numa coalizão com um espectro ideológico bem amplo”, comenta o cientista político Vitor Sandes, professor da UFPI, acrescentando que o palanque petista ainda tem o peso eleitoral de Lula, com aprovação superior a 80% entre os teresinenses, e do governador Rafael Fonteles, a contar com mais de 90% de avaliações positivas na capital.
Com candidatos competitivos, a sigla dará especial atenção às disputas em Natal, Fortaleza, Teresina e João Pessoa
“Vamos investir pesado no Nordeste, mobilizar as principais lideranças do partido e priorizar, do ponto de vista dos recursos financeiros, os candidatos com mais chance de chegar ao segundo turno. Esse é o direcionamento do partido. Vamos fazer o que pudermos para impulsionar as campanhas que têm viabilidade”, explica o senador Humberto Costa, integrante do grupo de trabalho das eleições do PT Nacional. Ele acrescenta que a legenda também vai priorizar “palanques de peso e densidade de outros partidos que fazem parte da nossa aliança histórica”, citando a candidatura à reeleição no Recife, com João Campos, do PSB, e em Maceió, onde o partido decidiu apoiar o emedebista Rafael Brito, deputado federal ligado ao senador Renan Calheiros. No fim de julho, o PT fez uma intervenção no diretório municipal de Maceió e retirou a candidatura própria do ex-vereador Ricardo Barbosa, que havia sido aprovada em convenção local.
Em Fortaleza, a queda de braço no campo progressista inaugurada nas eleições de 2020 e potencializada em 2022 vai se repetir este ano. De um lado, o PDT de Ciro Gomes trabalha pela reeleição do prefeito José Sarto. Do outro, o PT de Camilo Santana, ministro da Educação, acredita na decolada da candidatura de Evandro Leitão, presidente da Assembleia Legislativa. O petista aparece nas pesquisas na quarta colocação, com 9,4% das intenções de voto, metade da pontuação do candidato pedetista, revela sondagem da Paraná Pesquisas divulgada no fim de julho.
Neopetista. Ligado a Cid Gomes, o deputado estadual Everaldo Leitão migrou para o PT a convite de Camilo Santana, suplantando o desejo de Luiziane Lins de concorrer
Para superar a desvantagem, Leitão conta com a força de Lula, que já se comprometeu em participar de eventos de campanha. O presidente, inclusive, confirmou sua presença na convenção do petista, prevista para acontecer no sábado 3, após o fechamento desta edição de CartaCapital. “Ainda não houve uma massiva apresentação das propostas e das causas que cada candidatura vai defender. Os fortalezenses vão, em breve, identificar na minha candidatura os valores progressistas, humanizados, inclusivos e igualitários. Poderão conhecer melhor minha trajetória como gestor e como parlamentar comprometido com a justiça social e a defesa da democracia.”
Oito partidos reforçam o palanque petista, que tem como candidata a vice-prefeita Gabriella Aguiar, deputada estadual pelo PSD. Apesar de preterido na indicação de vice, o PSB do senador Cid Gomes também apoia a chapa petista, mas trabalha, principalmente, para eleger o maior número de prefeitos no Ceará, de olho na sucessão de 2026. Desde que rompeu politicamente com o irmão Ciro Gomes e deixou o PDT, Cid assumiu o comando do PSB no estado e já contabiliza mais de 80 prefeitos no seu grupo político, que deixaram as hostes pedetistas para acompanhar o senador.
Evandro Leitão também era ligado a Cid, mas optou por um caminho distinto. Aceitou o convite de Camilo Santana e migrou para o PT, com o compromisso de ser o candidato do partido na sucessão de Fortaleza, suplantando o desejo de Luiziane Lins, deputada federal e ex-prefeita, de voltar a governar a capital cearense. A opção arriscada do neopetista pode até lhe custar caro, já que o PDT briga na Justiça pelo mandato, alegando a regra de infidelidade partidária.
Na capital cearense, Evandro Leitão confia na força de Lula e de Camilo Santana para deslanchar nas pesquisas eleitorais
Para além do acirramento entre PT e PDT, dois candidatos da extrema-direita disputam o voto conservador em Fortaleza. Capitão Wagner, do União Brasil, lidera a corrida com 33% das intenções de voto, segundo a Paraná Pesquisas. O outro palanque é o capitaneado pelo deputado estadual André Fernandes, do PL, a se apresentar como um “bolsonarista raiz”. Ele tem 15%. Wagner, já um velho conhecido do eleitorado cearense, vem disputando sucessivas eleições, sempre sai na frente nos pleitos majoritários, mas termina derrotado, o que lhe rendeu a alcunha de “cavalo paraguaio”. Em 2020, por sinal, chegou muito perto da vitória, mas perdeu para Sarto no segundo turno por uma diferença de 3%. Em 2022, foi candidato a governador e terminou em segundo lugar, atrás do petista Elmano de Freitas, eleito no primeiro turno. Neste ano, tenta novamente a prefeitura de Fortaleza e larga com uma vantagem considerável em relação aos rivais.
“Eu considero que a disputa em Fortaleza ainda está em aberto, mas um ponto que chama atenção é a força com que Camilo Santana saiu nas eleições de 2022, o que coloca o PT em um cenário de grande competidor no pleito. E ainda tem um conjunto de outras siglas de peso no estado, a exemplo do PSB, hoje o maior partido no Ceará, o MDB de Eunício Oliveira, o PSD de Gilberto Kassab e Domingos Filho, uma das maiores lideranças locais, que conseguiu emplacar a filha na vice”, comenta a socióloga Monalisa Torres, pesquisadora e professora da Universidade Estadual do Ceará. “Temos um palanque muito forte. O político mais bem avaliado é o ministro Camilo Santana. Sem falar no apoio de Cid Gomes e do governador Elmano de Freitas, que está com uma avaliação razoável”, observa Costa.
A deputada federal Natália Bonavides é a aposta do PT em Natal, apesar da dificuldade de emplacar a candidatura devido à alta rejeição da gestão Fátima Bezerra, governadora petista em seu segundo mandato. Ela aparece em terceiro lugar em recente pesquisa do Instituto Seta, com 15% das intenções de voto, atrás de Paulinho Freire, do União Brasil e candidato do prefeito Álvaro Dias, e do senador bolsonarista Rogério Marinho, que tem 20%. O ex-prefeito Carlos Eduardo, do PSD, lidera a corrida, com 35%. De acordo com Bonavides, nas sondagens internas ela aparece em segundo lugar, com chance concreta de chegar ao segundo turno.
Fortaleza. Com 18% das intenções de voto, o dobro do rival petista, José Sarto busca a reeleição pelo PDT de Ciro Gomes – Imagem: Redes sociais/PDT12
“Nas últimas duas décadas, Natal foi governada por grupos políticos que representam as elites e se revezam no poder. Nossa candidatura tem grande potencial, como não se via há muito tempo no campo popular democrático. Será uma campanha conectada com as ruas, com o sentimento das pessoas. Somos a única candidatura capaz de representar isso. As outras são a continuidade de gestões passadas”, diz Bonavides, minimizando o desgaste da gestão Fátima Bezerra, que chega a ter mais de 70% de desaprovação em Natal. “A governadora teve um primeiro mandato difícil, pegou a pandemia e sofreu vários atos explícitos de boicote do governo Bolsonaro. Agora, com a parceria do presidente Lula, a situação tende a melhorar”, acredita. “Sabemos que a avaliação de Fátima não é das melhores, mas Lula está muito bem no Nordeste. Eu acho que compensa”, completa Costa.
Para o cientista político Anderson Santos, professor da UFRN, além de se descolar da baixa popularidade da governadora, o maior desafio de Bonavides será consolidar-se como o nome de oposição ao atual prefeito. “Carlos Eduardo é o principal opositor à gestão Álvaro Dias e Paulinho Freire será o candidato da situação. É difícil ver um segundo turno entre dois candidatos de oposição. Além de que com Carlos Eduardo acontece um fenômeno chamado recall, ele já foi prefeito e seu governo foi popular. Há, no entanto, um ponto fraco: ele não demonstra apetite ou disposição para costuras políticas, parece estar muito seguro de sua posição nas pesquisas.”
Em João Pessoa, o PT confirmou o nome do deputado estadual Luciano Cartaxo para disputar a capital paraibana. Ex-prefeito por dois mandatos e ex-vice-governador, Cartaxo disputa a segunda colocação nas pesquisas com o ex-ministro da Saúde de Bolsonaro, Marcelo Queiroga, do PL. Em pesquisa divulgada no início de julho pelo Instituto Veritá, o petista aparece com 14,8% e o bolsonarista com 19,5%, empatados tecnicamente, considerando a margem de erro de 3,5 pontos porcentuais. Com 27,9%, o prefeito Cícero Lucena, do PP, busca a reeleição. Em Aracaju, o PT lançou o nome da jornalista Candisse Carvalho, mas a candidatura não está decolando, pontua menos de 3% das sondagens eleitorais. A legenda também investe em cidades-polo como Petrolina, Olinda e Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, e Feira de Santana, Camaçari, Vitória da Conquista e Barreiras, na Bahia. “Teremos um resultado bem razoável no Nordeste”, prevê Costa. •
Publicado na edição n° 1322 de CartaCapital, em 07 de agosto de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Reduto lulista’