Não é novidade que a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre os brasileiros caminha na corda bamba neste seu terceiro mandato. No entanto, pesquisas de opinião recentes acenderam o alerta nos corredores do Palácio do Planalto ao revelar que, como mostra reportagem de VEJA, a aprovação do governo federal vem mais que cambaleando no histórico reduto eleitoral do PT: a região Nordeste.
Nas últimas semanas, estudos publicados por três institutos — Ipec, AtlasIntel e Paraná Pesquisas — mostram que a aprovação ao terceiro mandato do petista recuou acima de dez pontos na mais tradicional trincheira da esquerda do país. Na visão de especialistas, um conjunto de fatores em âmbito nacional e regional pressionam o apoio de Lula e, às vésperas das eleições municipais, ameaçam a hegemonia vermelha entre o eleitorado nordestino.
Economia lenta
Durante a primeira passagem do PT pela Presidência da República, o Nordeste testemunhou um boom econômico jamais vivenciado em sua história. Entre 2003 e 2013, a região teve um índice de crescimento econômico de 4,1% ao ano — acima da média nacional, de 3,3% —, viu o número de estudantes universitários disparar de 400.000 para 1,4 milhão e atingiu o recorde de 13,5% de participação no PIB nacional.
Já com o retorno de Lula ao Planalto, uma das grandes frustrações do eleitorado nordestino é que, justamente, a expectativa criada pelo novo velho governo ainda não se materializou em uma nova onda de prosperidade. Mesmo com a desocupação em queda no país — 7,8% no primeiro trimestre deste ano —, o Nordeste segue com o maior percentual de desempregados entre as regiões (10,4%) e todos os estados nordestinos têm taxas maiores do que a média nacional. “Para o eleitor nordestino, que esperava uma melhora mais rápida, parece que o sonho acabou”, avalia Murilo Hidalgo, diretor do instituto Paraná Pesquisas.
‘Mais do mesmo’
Outro motor de insatisfação dos nordestinos com Lula é a repetição de programas sociais emblemáticos, como o Bolsa Família — revolucionário nas gestões anteriores do PT, o projeto já não surte o mesmo impacto na opinião pública em 2024 e, para piorar, teve seu poder de compra corroído pela inflação.
Mesmo pessoas ligadas à cúpula do governo reconhecem que os projetos que glorificaram a gestão do PT nos anos 2000 vêm perdendo fôlego. O ministro-chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, destacou que o próprio Bolsa Família excluiu 3,7 milhões de beneficiados após uma recente revisão no cadastro, afetando principalmente moradores do Nordeste.
Discurso
Na falta de grandes novidades para apresentar à população, Lula e aliados vêm investindo no discurso de enfrentamento ao bolsonarismo e defesa da democracia — algo que foi valioso em um determinado momento, mas que não consegue sustentar um governo a longo prazo e, por isso, desagrada ao eleitorado que espera avanços concretos.
A retórica profundamente sustentada no combate à extrema direita, aliás, vem desde a campanha eleitoral — alguns analistas sugerem que, no percurso de ressurgir das cinzas para derrotar Bolsonaro, o PT praticamente se pautou somente em ser a oposição. “O PT evoca continuamente a ideia de que a vitória de Lula salvou a democracia, mas esta compreensão já está consolidada entre o eleitorado. E o governo vem falhando em comunicar com clareza quais são as próximas pautas prioritárias”, afirma Yuri Sanches, diretor de risco político do instituto AtlasIntel.
Cabe, ainda, ressaltar que os controversos posicionamentos do governo em relação a temas globais, como o conflito em andamento entre Israel e Hamas na Faixa de Gaza, alimentam um sentimento de receio em parte do eleitorado. Exemplo disso foram as recorrentes manifestações de apoio incondicional do PT ao grupo político-terrorista palestino, e a declaração de Lula equiparando os bombardeios israelenses ao Holocausto praticado pela Alemanha nazista contra o povo judeu.
Crise na segurança
A percepção de aumento da criminalidade violenta em todo o Brasil paira sobre o governo desde a volta de Lula ao Planalto, e os nordestinos têm razões mais que suficientes para estarem insatisfeitos. O Nordeste concentra quase metade das cinquenta cidades mais violentas do país, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, e enfrenta ondas de crimes na Bahia e no Rio Grande do Norte, ambos administrados pelo PT.
No campo da segurança, contam a favor do governo os recentes avanços nas investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco, que praticamente congelaram durante os quatro anos da presidência de Bolsonaro. No entanto, os efeitos da vitória se diluem em regiões como Mossoró, no Rio Grande do Norte, que viveram cinquenta dias de tensão enquanto o recém-empossado ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, encabeçava as buscas por dois perigosos detentos que escaparam da penitenciária federal do município.