Ícaro Carvalho
Repórter
Margareth Grilo
Editora de Economia
O Rio Grande do Norte terá, em até 120 dias, a primeira fábrica para beneficiamento e enlatamento de atum. A unidade fabril está sendo instalada na margem da BR-304, na região de Mossoró, próximo à saída para o município de Apodi, e terá capacidade para processar de 15 a 25 toneladas por dia do pescado. As informações foram confirmadas à TRIBUNA DO NORTE pelo empresário potiguar Márcio Rabelo. Ele explica que a iniciativa é uma parceria da sua empresa Conservas 77, estabelecida em Mossoró, com a Frescomares, da qual é sócio, e que já faz o enlatamento de camarão.
“Nossa previsão é bem otimista, porque hoje a gente tem bastante atum aqui. Areia Branca, por exemplo, é o segundo maior polo pesqueiro de atum do Brasil. Então, eu acredito que a gente vai começar, no mínimo, processando 10 toneladas dia, mais ou menos 70% de nossa capacidade total. E é muito interessante que nosso Rio Grande do Norte tenha uma planta de enlatamento regional”, diz Márcio Rabelo.
Segundo o empresário carioca, a previsão é de que a nova empresa gere de 65 a 80 empregos diretos, dentro da unidade, e de 200 a 240 indiretos, considerando a parte de transporte, movimentação de cargas e embalagens e outras demandas da cadeia produtiva. A unidade fabril tem 3.900 metros quadrados de área construída e mais 4.123 de metros quadrados para movimentação de carretas, recebimento de atum e outras necessidades de produção.
“Ela é uma planta totalmente moderna, com verticalização. É uma planta que vai receber, a princípio, o grande volume do atum do RN, de Areia Branca, para beneficiar e gerar emprego no nosso Rio Grande do Norte”, afirma Márcio Rabelo, confirmando que 70% da planta já está concluída. Segundo ele, a planta da unidade fabril teve autorização do Idiarn (Instituto de Defesa e Inspeção Agropecuária do RN) para o início das obras.
“Não é um projeto, já está sendo realizado. O galpão, a estrutura, frota, está tudo pronto, só estamos adequando os detalhes, recebendo os maquinários, e aguardando a finalização do processo de licencia-mento, que tem todo um trâmite para, posteriormente, começarmos a operar”, explica.
O empresário já vislumbra crescimento. “Após a abertura, a gente vai ampliando em turnos porque toda enlatadora trabalha de dois turnos em diante porque tem todo um sistema de caldeiras, de esterilização em todo o processo que demanda mais horas”, afirma Márcio Rabelo. Ele pensa em, no futuro, fabricar, por exemplo, a farinha de atum e outros derivados.
O planejamento da Conserva 77 é fazer a venda do atum enlatado no Rio Grande do Norte para todo o Brasil. “Vamos distribuir para todo o país, com toda a legalização, com o SISBI (adesão ao Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal). Queremos uma indústria que possa comprar o peixe do RN, no caso o atum, para poder desenvolver, e fortalecer toda a cadeia produtiva”, explica.
Enlatamento no Ceará
Atualmente, em Areia Branca, município a 326,4 quilômetros de Natal, mais de 70% do atum pescado por cardume associado são direcionados para o enlatamento, feito no Estado do Ceará. O processamento, segundo o secretário de Estado da Agricultura, Pecuária e Pesca, Guilherme Saldanha, é feito por uma multinacional espanhola.
“É atum nosso que sai daqui para ser processado no Ceará, para depois ser exportado no Brasil”, comenta o secretário, ressaltando que o governo do Estado tem convidado empresas para atuar nesse negócio no Estado. “Não faz sentido estar pagando combustível, frete de caminhão para levar esse atum para lá. O frete do pescado é um frete muito caro, porque você paga quase 50% de produto e o resto só de gelo, e caminhões frigoríficos também têm um frete bem mais caro”, diz.
O secretário antecipou à TN a informação da instalação da empresa de enlatamento em Mossoró. “Eles já estão fazendo camarão enlatado e vão começar a comprar atum para enlatar. Isso pode fazer uma verdadeira revolução porque essa empresa em funcionamento vai gerar emprego e renda aqui, no nosso Estado, e não vai mais sair atum para o Ceará, porque ela [a empresa] vai ter a competitividade do frete”, diz Guilherme Saldanha.
Para chegar ao Ceará, o atum sai de Areia Branca passa em Mossoró, atravessando quase 350 quilômetros para chegar na fábrica instalada depois de Fortaleza. Entre Areia Branca e Mossoró, onde funcionará a fábrica da Conservas 77, a distância a ser percorrida é de aproximadamente, 40 quilômetros.
Brasil: cota para 2024 é de 5,6 mil t
A cota do Brasil para pesca da espécie Albacora-Bandolim (Thunnus obsesus) ficou estabelecida em 5.639 toneladas para 2024, segundo Portaria Interministerial MPA/MMA 12, de 02 de agosto de 2024, que regula a quantidade máxima de capturas de atum, visando garantir a sustentabilidade e os estoques do pescado para os anos seguintes.
A espécie é uma das principais buscas e alvos das pescarias de atum no país e no Rio Grande do Norte . Em 2023, o Governo Federal chegou a suspender a pesca do atum no fim do ano para que o Brasil não ultrapassasse a cota fixada pela Comissão Internacional para a Conservação dos Atuns do Atlântico (ICCAT).
De acordo com a portaria, as modalidades com maior cota da pesca do albacora-bandolim são a de Espinhel Horizontal de Superfície (1.980 t) e a de cardume associado (2.531 t), ambas utilizadas por pescadores do RN, nas regiões de Natal e Areia Branca.
A portaria estabelece ainda que as atividades de pesca das embarcações autorizadas na modalidade de permissionamento Espinhel horizontal de superfície sejam encerradas quando a captura da espécie albacora-bandolim alcançar 95% da cota total estabelecida. Para a modalidade de Cardume Associado, a pescaria deve ser encerrada caso a captura alcance 80%.
Segundo o secretário nacional de Registro, Monitoramento e Pesquisa, Luís Gustavo Cardoso, uma das medidas para evitar a suspensão da pesca em 2024 é a adoção do Mapa de Bordo Digital. “Até ano passado tínhamos ele em papel. Imagine embarcações entregando esses mapas em toda a costa em papel, tendo que enviar para serem digitados e contabilizados. Este ano, já temos um avanço que é a implantação dele de maneira digital, de modo mais rápido”, cita.
O Mapa de Bordo mostra quanto cada mestre capturou numa viagem, precisando informar onde pescou, quantos lances deu, duração da viagem e volume de pesca de cada espécie. “Todas essas informações são utilizadas pelo MPA para tentar garantir que o Brasil não ultrapasse as cotas e garanta esse controle das capturas”, acrescenta.
RN recebe projeto piloto do ICMBio
A expertise do RN no atum fez com que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) adotasse o Estado como parte do projeto piloto “Parceiros do Oceano Atlântico”, com o intuito de testar e implementar iniciativas inovadoras para otimizar e qualificar a gestão da pesca.
Segundo uma das coordenadoras do projeto Mônica Brick Peres, analista ambiental do ICMBio, a semente do Projeto Parceiros foi um Programa de Voluntariado com os mestres e tripulantes da frota de espinhel pelágico em Natal. O trabalho com os mestres começou em junho de 2019, foi lançado oficialmente em janeiro de 2020.
“A ideia inicial foi desenhar um Projeto Piloto nesses territórios que pudesse construir, passo a passo com o setor pesqueiro, um modelo de gestão da pesca “ideal”, que pudesse ser expandido para outras Unidades de Conservação Marinhas ou outras pescarias no país. O que entendemos como “ideal”? Um conjunto de iniciativas ganha-ganha, onde conseguimos priorizar a adoção de boas práticas de pesca sustentável – focando na proteção de espécies ameaçadas, e um aumento do rendimento econômico, ou pelo menos, a abertura de novos mercados para o pescado produzido por essas empresas e embarcações que participam do Projeto Parceiros”, explica Mônica Brick Peres.
Uma das ideias já colocadas em prática foi a adoção de videomonitoramento em dois barcos pesqueiros de Natal, visando avaliar toda a prática pesqueira desde a saída do barco, a pescaria e seu retorno, incluindo eventuais devoluções de pescas acompanhantes. As imagens, em outro momento, são utilizadas para treinamentos e capacitações dos pescadores. “Temos informação de como é a dinâmica da pesca e qual o resultado dela. Essas informações são fundamentais para gestão e manejo da pesca sustentável”, explica.
Aliado a isso, está sendo desenvolvido uma espécie de selo de sustentabilidade para ser implementado no segmento pesqueiro posteriormente. “Para ganhá-lo será necessário precisará cumprir todas as normas, permissões e autorizações em dia, câmeras no barco, usar os anzóis circulares, por exemplo”, cita.