Um dos partidos políticos mais tradicionais do País, o PDT chega na disputa pela Prefeitura de Fortaleza de 2024 com uma configuração diferente de 2020. De detentora do maior número de administrações municipais do Ceará após o último pleito (67), a sigla brizolista passou a figurar entre as menores após debandada de prefeitos que deixaram a legenda para seguir o senador Cid Gomes no retorno ao PSB. Atualmente, comanda apenas 10 cidades.
Na janela partidária, a agremiação diminuiu ainda mais de tamanho com a migração de vereadores e outros gestores que ainda estavam indecisos. Na Capital, porém, o PDT continua despontando como o partido mais influente: é o maior em quantidade de parlamentares, comanda a Câmara Municipal (CMFor) e o Paço. Pode-se dizer, inclusive, que a legenda ganhou fôlego em Fortaleza diante das perdas que sofreu. Não é mais aliada do Palácio da Abolição diante do rompimento com o PT no âmbito do Governo do Estado, perdeu dois legisladores, mas ganhou outros cinco, totalizando 13 representantes em exercício na CMFor.
Neste domingo (28), a sigla de Leonel Brizola vai confirmar o lançamento da candidatura do prefeito José Sarto para a reeleição. O evento ocorrerá no Colégio Farias Brito, no bairro Benfica, a partir das 9h. Lideranças pedetistas como o ex-ministro Ciro Gomes, o ex-prefeito Roberto Cláudio e o deputado federal André Figueiredo devem estar presentes.
Apesar das derrocadas que sofreu desde o rompimento com o PT após a eleição pelo Palácio da Abolição em 2022, a legenda projeta se reerguer exponencialmente, mantendo os fundamentos brizolistas do partido, ainda que algumas alianças para alcançar tal feito sejam alvos de questionamentos.
Todavia, como aponta o próprio presidente pedetista no Estado, Flávio Torres, o partido sempre se manteve influente com a valorização de suas próprias pautas, pela defesa de direitos trabalhistas e pela Educação, independente da chegada e saída de lideranças.
Esta, inclusive, não é a primeira vez que o partido infla e reduz no Ceará, impactando, inclusive, em Fortaleza. Confira abaixo o histórico do PDT na disputa pela Capital.
Fundação
O Partido Democrático Trabalhista nasceu na esteira do processo de redemocratização do Brasil, sendo fundado em 1979 por Leonel Brizola, na abertura política no País — período que permitiu a criação de novas legendas durante a Ditadura Militar (1964-1985). Com a instauração do regime totalitarista em 1964, apenas duas agremiações podiam atuar: o Arena, que apoiava o regime, e o MDB, à época tido como uma oposição “tolerável”. As demais foram extintas e resistentes perseguidos, presos, mortos ou exilados.
O exílio, inclusive, foi a alternativa para Brizola, que naquela época já tinha sido deputado estadual, federal, prefeito de Porto Alegre e governador do Rio Grande do Sul pelo antigo PTB — extinto pelo AI-2, em 1965, recriado na abertura política e fundido com o Patriota em 2023, formando atualmente o PRD. Ao voltar para o Brasil em 1979, quando entrou em vigor a Lei da Anistia, ele fundou o PDT, incorporando ideais trabalhistas getulistas. O partido foi homologado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 1980, existindo até os dias de hoje.
Ainda na década de 1980, a legenda começou a disputar as primeiras eleições diretas, ampliando a atuação nos estados e capitais.
No Ceará, o PDT foi fundado pelo ex-senador Flávio Torres, que retornou à presidência da legenda neste ano durante racha interno que culminou na saída de Cid Gomes em fevereiro para o PSB.
“Eu fui o primeiro presidente do PDT Ceará, eu estou na quinta vez como presidente. Toda crise do PDT, Brizola me chamava e agora continuam me chamando, mas eu saio já, já, estou passando uma chuva. Estou até animado, mas é um sacrifício grande ter que viajar na minha idade, é complicado”, expõe Torres.
Ele acrescenta que quem deve voltar a assumir o comando do partido no Estado quando ele sair é o deputado federal André Figueiredo, atual presidente interino da legenda nacionalmente. Figueiredo já está na agremiação há 40 anos, tendo entrado ainda no movimento da Juventude Socialista.
Primeira eleição na Capital
O partido disputou a primeira eleição na Capital em 1985, quando lançou o então deputado Manoel Aguiar de Arruda, professor, sindicalista e perseguido da ditadura. Arruda foi um dos cearenses que teve o mandato cassado durante o regime, quando era vereador de Fortaleza.
Apesar de ser visto como um bom nome para o pleito à época, ele acabou renunciando para apoiar Paes de Andrade, que aparecia em primeiro lugar nas pesquisas. Com isso, o PDT teve que recalcular a rota e lançou Flávio Torres como cabeça de chapa e Moema Santiago, outra fundadora, como vice. É o que relembra o dirigente.
“A primeira eleição que o PDT concorreu foi na eleição da Maria Luiza (PT). O PDT lançou Manoel, o vice era um cidadão chamado Castelo. A um mês da eleição, o Manoel renunciou para apoiar o Paes de Andrade. Aí, a Moema Santiago, que era uma fundadora junto comigo, se lançou e me colocou como vice. Apesar de não ter sido a eleita, a Moema fez uma campanha que deu a ela a eleição de deputada federal (posteriormente)”
Outras eleições
Nos pleitos seguintes, a agremiação continuou lançando candidaturas na Capital. Em 1988, por exemplo, o representante era o radialista e então deputado Edson Silva, que foi, inclusive, motivo de confusão no PT. Naquela época, o PT estava dividido sobre como iria se posicionar no pleito. O grupo da então prefeita Maria Luiza queria Dalton Rosado como candidato, ex-secretário da gestora, enquanto a Executiva petista defendia apoiar Edison Silva, do PDT.
A aliança acabou não acontecendo, mas a divergência interna no Partido dos Trabalhadores culminou na expulsão da prefeita e do seu grupo. Apesar de ter obtido outros apoios, a postulação pedetista também não saiu vitoriosa da disputa. Quem levou foi Ciro Gomes, que à época estava no PMDB (atual MDB).
“A gente perdeu pro Ciro por poucos votos”, relembra Torres.
A diferença entre as postulações foi de apenas 5.317 votos válidos. Ciro obteve 179.274 sufrágios, enquanto Edson Silva ficou com 173.957.
Filiado à legenda há 23 anos, o vereador em exercício Iraguassú Filho conta que ingressou por influência do pai, Iraguassú Texeira, quadro histórico do partido. Para ele, a agremiação brizolista sempre teve um médio porte, com representatividade na Câmara Municipal e nomes fortes para formar chapas para o Executivo.
“Em 1988, foi a primeira eleição que meu pai disputou, foram (eleitos) seis vereadores. Se eu não me engano, eram 28 vereadores na Câmara, não 43 como é hoje. O PDT sempre foi um partido de médio porte, sempre manteve uma bancada com pelo menos dois vereadores e sempre formou chapa para disputar eleições municipais majoritárias. Só não disputou uma eleição municipal majoritária, que foi em 2000, se não me engano”, pontua.
A única eleição que o PDT não lançou candidatura em Fortaleza foi a de 2000, quando o partido decidiu apoiar Inácio Arruda (PCdoB). A lista de postulações pedetista desde a redemocratização carrega nomes como:
- Manoel Aguiar de Arruda, em 1985;
- Edson Silva, em 1988;
- Lúcio Alcântara, em 1992;
- Oscar Filho, em 1996;
- Heitor Férrer, em 2004, 2012;
- Patrícia Saboya, em 2008;
- Roberto Cláudio, em 2016;
- José Sarto, em 2020.
O PDT quase conseguiu ir ao segundo turno na eleição de 2012, com Heitor Férrer como candidato. Ele obteve 262.365 votos (20,97%) no primeiro turno, 29.375 a menos que Roberto Cláudio, que acabou saindo vitorioso do pleito. Heitor Férrer só saiu da legenda em 2015, com a chegada dos irmãos Ferreira Gomes e de seu grupo político, após quase 30 anos de filiação. Na agremiação, foi quatro vezes vereador e quatro vezes deputado estadual.
A chegada dos Ferreira Gomes
Em 2015, os irmãos Ciro e Cid Gomes, desembarcaram no PDT, já consagrados como lideranças políticas do Ceará e de projeção nacional. À época, o clã já tinha rompido com o PT em Fortaleza, mas mantinha aliança com petistas no âmbito do Governo do Estado, uma vez que Camilo Santana (PT), então governador, foi lançado por Cid em 2014. Assim, mesmo rompendo com Luizianne Lins (PT) na eleição de 2012, a parceria entre Governo e Prefeitura continuou até 2022.
Vale relembrar que Roberto Cláudio, que saiu vitorioso do pleito Municipal de 2012, ainda pelo PSB, era do grupo dos irmãos. O prefeito também foi para o PDT em 2015, fazendo com que a legenda finalmente alçasse o Executivo da Capital e permanecesse até hoje — com a reeleição de Roberto em 2016 e eleição de José Sarto em 2020. À época, outros 63 prefeitos do Interior do Estado também seguiram o bonde, tornando-se pedetistas.
De lá para cá, os irmãos levaram a sigla ao “pódio” dos partidos no Ceará, tornando-a líder em número de prefeituras e montando fortes bancadas de parlamentares nas Câmaras Municipais, na Assembleia Legislativa e na Câmara dos Deputados. Nomes de outras agremiações também foram sendo reforçados no caminho, com surgimento de novas lideranças e alianças que duraram até pouco tempo atrás.
Cientista política e professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres avalia que a chegada do grupo político transformou a agremiação brizolista, que, apesar de ter tido nome memoráveis da história política do Estado, não tinha conquistado um tamanho tão expressivo.
“Nesse movimento da chegada dos Ferreira Gomes, o PDT se transforma da noite para o dia em um dos maiores partidos do Ceará, tanto em número de prefeituras quanto em número de parlamentares. É tanto que, nas últimas eleições, a força da bancada do PDT se transformou no Congresso, se tornou mais expressiva por conta do desempenho que tinha obtido no Ceará. E a eleição de 2020, se eu não me engano, foi a que o PDT teve o melhor desempenho, conquistando 64 prefeituras”
Assim como inflou, o grupo também fez “encolher”, como complementa a cientista política.
Nova linha no cenário atual
Com a saída de Cid Gomes em fevereiro deste ano, o PDT perdeu mais de 40 prefeituras, além de vereadores que migraram para outras legendas durante a janela partidária para se manter no arco de aliança governista do Ceará.
“Em fevereiro eu tinha feito um outro levantamento para ver como estava a situação dos partidos por prefeitura. Com a saída do Cid, o PDT só tinha 21 prefeituras. E houve outras migrações (posteriormente)”, pontua Monalisa Torres.
Atualmente, a sigla possui o comando de 10 prefeituras. São elas:
- Abaiara
- Antonina do Norte
- Aracoiaba
- Baixio
- Cariré
- Farias Brito
- Fortaleza
- Guaramiranga
- Potengi
- Ubajara
A expectativa, segundo a assessoria da agremiação, é chegar a 15 no pleito deste ano. Ao todo, 30 pedetistas devem encabeçar chapas ao Executivo dos municípios. A migração de Cid para o PSB, bem como a ruptura com o PT no âmbito do Palácio da Abolição, fez a legenda adotar nova postura.
Inicialmente apresentada como “independente” em relação ao Governo do Estado, mesmo durante o racha interno, hoje ela se coloca como “adversária” de candidaturas que são apoiados pelo governador Elmano de Freitas (PT) e pelo ministro Camilo Santana (PT).
Na região do Cariri, por exemplo, o Partido Democrático Trabalhista está apoiando a postulação do prefeito Glêdson Bezerra (Podemos), de Juazeiro do Norte, junto com o PL, que é o partido ligado ao ex-presidente Jair Bolsonaro no Estado. Nacionalmente, o PDT integra a base do presidente Lula (PT).
No Crato, Ciro, o ex-prefeito Roberto Cláudio e outros pedetistas marcaram presença na convenção de lançamento da candidatura de Dr. Aloisio (União) no último fim de semana. Junto a eles, estavam Carmelo Neto, presidente do PL Ceará e um dos bolsonaristas mais fiéis, e Roberto Pessoa (União), prefeito de Maracanaú e adversário histórico do ex-ministro.
Em Barbalha, os pedetistas têm outro aliado em comum com o bolsonarista Carmelo Neto, o pré-candidato Antônio Neto (PSDB). Sobre as alianças, o presidente do PDT disse que “não é contagioso” dividir palanque com aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro em prol de uma candidatura e de um adversário em comum.
“No município de Juazeiro do Norte, o prefeito é do Podemos. O PT lança um candidato, nós temos aproximação com o prefeito do Podemos, que é candidato à reeleição. É um apoio, mas simultaneamente apoia no mesmo palanque o presidente do PL do Ceará. A gente sobe pedetista e sai pedetista. Não é contagioso, é uma coisa que sobe junto para apoiar. Nós temos uma distância do PL astronômica, nós não temos nenhum candidato do PL que é apoiado pelo PDT. Nós apoiamos um terceiro, que atraiu o PL também”
Em Fortaleza, o prefeito José Sarto disse recentemente que está disposto a conversar com “quem for possível” caso vá ao segundo turno. Questionado sobre o assunto, Iraguassú Filho, que é da base do gestor, explicou que a declaração abrange do PL ao PT.
“O que for necessário de diálogo, dentro do que é republicano, o prefeito vai procurar. A gente está trabalhando para ir ao segundo turno e, no segundo turno, ganhar essa eleição”, afirmou.
Além de estratégica para a direção nacional pedetista, Fortaleza é tida como prioridade para lideranças como Ciro, Roberto e Sarto. Para Monalisa Torres, a eleição de 2024 vai mostrar o “poder de influência” das lideranças com o perde e ganha dos partidos.
“Qual o tamanho do PT, de Camilo Santana, que agora é, de fato, uma liderança importante e influente? Agora a gente vai ver a relevância que ainda tem Cid Gomes com o tamanho que o PSB pode ter depois da eleição. Com que tamanho o PDT, de Ciro, vai ficar? E o PSD, de Domingos Filho? Essa eleição vai nos dizer muito dos sobrenomes que carregam as legendas nas costas. E ainda tem as legendas que estão tentando se recompor, como o MDB”
“Essa eleição é uma antessala, uma preparação para as eleições de 2026”, finalizou a cientista.